quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Esquizofrénico - Capitulo 5




Os olhos pesavam-lhe lentamente. A cadeira onde estava amarrada era desconfortável e o foco de luz do candeeiro no seu rosto, não facilitavam o regresso da consciência.
Sentado defronte dela, o sujeito estudava-a , concentrado e mudo.
Doia-lhe a cabeça e pesavam-lhe as pernas. A custo tentava reorganizar a mente e tentar perceber o que se passava.
Mas desde que saìra do café com a sua amiga, que ela deixara de perceber o que quer que seja!
-Boa tarde!
-Só se for para si.
-Lamento toda esta situação, mas precisamos da sua colaboração.
-Claro que sim. Por isso me atacam e amarram.Penso que esta parceria não irá longe.
Um sorriso amarelo estalou no rosto do sujeito, que levantando-se devagar, continuou a falar, fazendo um nitido esforço, para abandonar o campo de visão dela:
-Queira desculpar, mas a menina não está presa. Apenas condicionada.
-Não estou com vontade para ironias.
-Pois acredito que não esteja. Mas saiba que é para o seu bem.
-Ah sim? 
-Efectivamente. Receio que pudesse reagir mal a um pequeno inquérito.
-Inquérito?
-Sobre o seu amigo.
-Não tenho amigos.
O sujeito sorriu ao de leve, num riso claramente forçado:
-Permita-me discordar, mas não concordo consigo.
-Quem são vocês?
-Nós? Somos os bons da fita!
-Pois e eu sou a rainha d sucata.
-Preciso que acredite em nós.
-E eu preciso de sair daqui!
-Sairá, assim que nos contar tudo o que sabe.
-Sobre?
O sujeito aproximou-se dela e estendeu-lhe uma foto de Marco Fortes:
-Sobre ele.
-Oh, isso é fácil. è um cliente do café!
O sujeito acendeu um cigarro e aproximou o foco de luz, mais perto dos olhos dela, sem contudo se mostrar:
-Receio que seja bem mais que isso!
-Como?
-Um cliente de café, não a convida a andar a saltar por pátios estranhos.
Oh meu Deus, pensou! Então eles sabiam. Então eles estavam lá? Não, não podia acreditar que Marco estivesse certo. Um doido como ele....Não podia estar certo, podia? Recuperando o seu ar frio, respondeu irónicamente:
-Uma rapariga tambem tem de se divertir!
-Saltar sobre pátios com um cliente?
Ela sorriu ao de leve e ignorou a provocação, fazendo que ele retomasse o inquérito:
-Sabia que o individuo em causa é extremamente perigoso?
-Perigoso?
-Bastante. Não própriamente por ele, mas por quem o quer apanhar!
-Vocês, calculo?
O sujeito circulava em redor da cadeira dela, esgrimindo o cigarro acesso, contra o ar rarefeito da pequena sala:
-Não. Nós não! Nós não estamos própriamente interessados nele, mas no que ele sabe.
-Ele? Ele não sabe nada. É um individuo alucinado, que bebe café por uma chávena que ele próprio traz, maníaco por limpezas,e com quem é impossivel ter um diálogo coerente.
-No entanto. desperta-lhe a atenção e a curiosidade?
-A mim? Nem por isso!
-Deixe-me contar-lhe a minha versão dos factos...
-Esteja á vontade. Amarrada como estou, nunca o poderia impedir.
O sujeito soltou uma gargalhada irónica e sentando-se ao lado dela, falou-lhe ao ouvido:
-Se ele não lhe desperta curiosidade porque ligou para o antigo emprego dele?
Rita sentiu-se a gelar por dentre. Dentro das suas veias, o sangue congelara e de repente sentiu-se pálida e tonta. So a custo consegui voltar a raciocinar, segundos depois. Eles tambem sabiam disso? Como podiam saber?:
-Digamos que sou curiosa.
-A curiosidade é uma mina de encrencas, sabia?
-Deve ter andado na mesma faculdade que o meu pai, a retórica é a mesma!
-Um bom sujeito, calculo.
-Depende do ponto de vista!
O sujeito levantou-se pausadamente e em passos vagos, desligou o foco de luz que a atacava, originando a que uma explosão de sombras caísse sobre os olhos dela. A custo e com algum sofrimento ela teve que readaptar a visão à escuridão do pequeno quarto:
-Então, a menina não quer saber dele, mas liga para o anterior emprego e na altura em que ele mais precisa de auxilio, surge do nada e vendo-o abandonado e ensaguentado, em vez de contactar a policia, dá por si a saltar pátios...
-Sim. Acredito que possa parecer estranho.
-Vá lá! Diga o que sabe!
-Mas eu não sei nada.
-Está a perder tempo!
-Quem são vocês?
-Nós somos da policia. Digamos que somos da policia. Já ouviu falar no SIS?
-Aquela coisa dos espiões?
-Sim. Mais ou menos.
-Ok, conta outra! Essa não cola!
-Acredite! Calculamos que esse sujeito tenha relações com uma rede terrorista...
-Terrorista? O Marco Fortes terrorista? Por favor...
-Marco Fortes?
-Sim, o nome do sujeito da foto.
-Como sabe o nome dele?
-Ele disse-me. Eu não costumo usar a bola de cristal para essas coisas!
-Que mais ele lhe disse?
-Que gosta do café curto!
O sujeito sentou-se pela primeira vez diante dela. O seu rosto era magro e bastante arrogante. Por outro lado, os seus finos lábios revelavam sabedoria, apesar de ostentarem um sorriso cínico:
-Há cerca de seis anos Marco Fortes, foi dado pela familia como desaparecido. Durante dois anos a policia procurou-o, apesar de ele não ser menor e nunca foi encontrado. Chegou a ser dado como morto, até que por um acaso, uma nossa investigação conduziu ao ressurgimento dele na vida publica. Mas ele estava diferente!
-Ele não era assim?
-Não. Era perfeitamente lucido e saudável. 
-Estranho.
-Redobramos esforços em perceber o porquê? Ele havia sido dado como desaparecido , quando se dirigiu a uma clinica para proceder a exames médicos. Temos fortes suspeitas que ele teve de certa forma ligação a uma célula terrorista e acreditamos que tenha sido contra a vontade dele. 
-Então, prendam-no!
-Não é assim tão fácil. Se o prendermos a célula foge. Queremos apanhar os mentores.
-Mas entretanto, ele arrisca-se a sofrer.
-Tal como você!
-Exacto... ( Ela não havia pensado nisso com clareza!)
Percebendo o estado de pânico no roste dela, ele apressou-se a concluir:
-Sabe da existência de um caderno?
-Um caderno?
-Sim. Um vulgar caderno A4, que ele sempre traz.
-Sim. Ele passa as tardes a escrever nele e no entanto...
-No entanto?
-No entanto, um dia vi e o caderno estava em branco.
-Em branco?
-Sim.
-Tem a certeza que era o mesmo caderno?
A jovem pareceu hesitar depois, encolhendo os ombros, supirtou:
-Já não tenho a certeza de nada!
-Nós pensamos que ele use o caderno para escrever sobre esses tempos em que esteve desaparecido e assim nos conduzir ao lider.
-Bom, só se ele o tiver na mala castanha!
-Não. Essa já está em nosso poder.
-Então foram vocês que o atacaram?
O sujeito ergueu-se e de costas para ela, sentenciou:
-Não. Foram eles! E creio que tambem não o encontraram.
-Oh meu Deus, que embrulhada!


Pela terceira vez, o Jeep percorria a mesma artéria secundária da cidade. Dentro da viatura, Marco Fortes apressava-se a justificar-se:
-Pensava que era por aqui. Tinha mesmo a certeza que era ...
-Por Deus, é a terceira vez que aqui vimos dar. Estamos perdidos!
-Bem, mas eu ia jurar que...
-Porque não admite que não sabe o caminho? - Explodiu o progenitor de Rita.
-Mas eu sei! Eu já lhe disse, vamos até à rotrunda, viramos na primeira e depois da ponte, na segunda à esquerda e ....
-Isso foi o que fiz estas três vezes.
-Mas é que você anda muito rápido.
-Rápido? Eu vou a 50!
-Mesmo assim...é muito rápido. Eu preciso de ver e é de noite.
-Precisa de ver? Oh Céus, isto está a ser bonito.
-Calma. Se o pressionar, ele enerva-se. - Carina esforçava-se por manter o sangue frio.
-Mas contudo, depois de passar a ponte, vire á esquerda...
-Oh homem cale-se....Diga-me como é o prédio!
-Prédio?
-O sitio...
-Ah, é uma fábrica!
-Uma fábrica? - Inquiriu alarmada Carina.
-Correcto.
-Mas não disse que era um prédio?
-Pois é tudo igual. Um prédio ou uma fábrica.
-A unica zona de fábricas que conheço fica para o outro lado da cidade! - esclareceu o velho militar.
-Nem pensar! Tem de passar a ponte e virar à esquerda , na rotunda para depois...
-Eu juro que o espanco!
-Calma! Vamos até à zona de fábricas a ver se ele...
-Ah, chegamos! - Sorriu prazenteiramente o jovem.
A viatura estacou apressadamente e atónitos os dois ocupantes assistiram ao andar descomplexado de Marco em direcção a um barracão cinzento:
-Não pode ser aqui! - Exclamou o ex-militar surpreso.


Foto de carlos Vilela

Sem comentários:

Enviar um comentário