quarta-feira, 18 de maio de 2011

Infidelius - Capitulo 5 (parte 1)


"Chegaste na brisa que lava os rostos cansados...
Trazias dois dedos de sonhos nos lábios,
nos olhos gaivotas,
fazendo razias, lambendo salitre,
em mares espelhados e imensos..." - Inês Dunas in (Des)Encontro...
http://librisscriptaest.blogspot.com/2011/01/desencontro.html

O dia surgiu solarengo, iluminando com rajadas de perfeitos raios solares a vidraça suja da janela do pequeno quarto.Caio acordou suado nessa manhã!
Apesar do mau hábito de dormir apenas de Boxers, o seu corpo apresentava ainda vestígios de pequenas partículas de suor que se colavama melancólicamnente à sua pele, como se dela quizessem fazer parte para sempre.
Mel e limão, num odor matinal inconfundível no sopro amargo de quem sonhara aventuras próprias da puberdade num corpo de jovem feito. Braços definidos e gestos sonolentos no acordar para mais um dia de perfeitos planos.
A uma semana de concretizar a perfeita fuga para a felicidade, todos os seus passos seriam calculados e estudados.
Não podia mais ficar naquela casa castradora, em que lhe tentavam criar os passos, como se ele fosse paralítico ou desmembrado.
Explicara pacientemente aos seus progenitores que Marisa era o seu sopro de vida, a sua razão de vivêr e consequentemente era o inverso do curso de medicina que o seu pai lhe prometêra oferecer.
Bisturis, cortes, dilacerações, comprimidos, estétoscópios, batas brancas, AVC, Rinites, salas de espera, pacientes, vida inteira de estudo...Não, a vida dele seria em sentido inverso!
Quando se é jovem e o Mundo nos cabe na palma da mão, não queremos saber de carreira, Politica, Religião ou sentido de responsabilidade. A realidade é distorcido pelos homens adultos e pela sociedade castradora de ideiologias.
Tudo o que ele queria era Marisa e isso era um projecto de vida...
-E vais vivêr de quê? Fedelho ingrato que não dás valôr ao que o teu pai se esforça pelo teu futuro?
-Caio não sejas infantil. Ouve a tua mãe. A vida começa agora para ti. Vais ter um curso, seres independente...-
-E o amôr?
-Que sabes tu do Amôr, jovem? - Gritou o pai irado.
-Mas eu preciso de saber? Não basta sentir?
-Caio, meu filho,o que sentes não é amor, é apenas um torpôr da tua juventude. Ninguém se apaixona aos 19 anos!
-Mãe, o amor não tem idade, isso eu sei...
-Ouve lá, se ela te deixa tão louco, salta-lhe para cima, resolve isso e concentra-te no teu futuro.
Pelo canto do olho, Caio apercebeu-se da face materna a enrugar-se num quadro de perfeita incredulidade:
-Então é essa a solução que vocês homens têm para resolvêr os problemas com mulheres? - Perguntou a mãe incrédula ao pai.
-Bom,, não....Mas...
-Salta-lhe para cima? É assim que resolves tudo na tua vida?
-Querida o que quiz dizer...
-Eu percebo muito bem o que queres dizer, mas sinceramente não creio que sejas a pessoa indicada para lhe dar conselhos.
-E tu és? Bem me lembro de certas cartas escritas pelo pulso de outros à socapa na tua mala.
-O que queres dizer com isso?
O silêncio instalou-se entre os três e repentinamente Caio ficou aliviado pela conversa já não ser sobre ele:
-Desculpa, prometi não falar mais sobre isso...
-Esqueletos no armário, mamã? - perguntou Caio divertido.
Incrédula ela ergueu-se sem desviar o olhar do marido:
-Após tantos anos, após tantas desculpas ainda permanece no teu coração o remorso. Como podes sempre usar esse argumento?
-Não é argumento. Apenas defendo aquilo que digo, que certamente tu não és igualmente a pessoa ideal para o guiar!
-Porquê?
-Porque és mulher e isso é exactamente o garante que não podes percebêr as duvidas de um homem.
-Calculo que saltar em cima das tuas secretárias mais novas, seja uma das formas de tirar duvidas!
Descontroladamente a mão firme dele rompeu o espaço aéreo e caiu como um raio na face lívida da esposa, numa palmada assente num mar de raiva e revolta.
Com o impacto ela caiu de costas na mesma cadeira, onde aguardava horas a fio em plena madrugada que ele voltasse das reuniões de trabalho, com cheiro a whiskey barato e perfume feminino embrenhado a sua essência.
Como um filme Noir, os três ficaram boquiabertos aguardando que numa fracção de segundos surgisse a voz fria do realizador, num CORTA! OK, TÀ FEITO final.
Ao invés, com todo o ar de enfado, farto da mesma rotina, Caio permaneceu atento e prontamente, invadido por uma onda de cinismo, aplaudiu:
-Bravo! Não haja quaquer duvida que falar de amôr com vocês é pura perda de tempo. Mas bem, lamentávelmente o facto de vos anunciar que não vou ser Doutor ou Engenheiro, que talvez pela necessidade de segurar a Mulher dos meus Sonhos, tenha de ser Padeiro ou Pedreiro, é apenas uma decisão minha. Não vos pedi que a apoiassem ou compreendessem. Apenas vos dou conhecimento.
Em pranto incomportável, a mãe abandonou rápidamente a sala e de olhar translúcido de raiva, o pai mirou-o em desafio:
-Tu não sabes o que queres ou o que dizes e fica sabendo meu menino, que irás para onde eu quizer e quando eu quizer. Um dia irás me agradecer, ouvis-te?
Caio encolheu os ombros:
-É como falar com uma parede!
E levantou-se afastando-se, como uma embarcação não autorizada a aportar naquele cais.
O tempo é um espasmo incontrolado, mesmo para aqueles que o pensam conseguir perpetuar. Naquele tempo, neste tempo, nesse tempo....Ali e naquele momento Caio marcara uma posição, crescêra subitamente e ousara desafiar o podêr investido numa figura paternal, sem redenção. 
O futuro era agora uma estrada curvilínia, sem apoios ou regressos.

Partir para esquecer, de vez!


Sem comentários:

Enviar um comentário