domingo, 23 de outubro de 2011

Infidelius - Parte II - Capitulo 5




Ao longe ela definhava, dia após dia,
com uma esperança infantil de que ele chegasse a tempo
e o amor de ambos se compadecesse e permitisse que ficassem juntos pelo menos um instante
antes dela ter de partir...
Um momento com ele seria uma eternidade de felicidade para ela...

Inês Dunas: A lenda da espera
http://librisscriptaest.blogspot.com/2011/07/lenda-da-espera.html


Tão metódicamente quanto o seu profissionalismo insistia, a detective pousou pausadamente as várias folhas de papel, que junto com algumas fotografias do local, completavam o processo em curso, mantido à sua guarda, examinou-as com atenção durante uns minutos e com uma raiva crescente meteu instintivamente a ponta do lápis Viarco á boca e roendo, qual castor pensativo, voltou a ler palavra por palavra, linha por linha.
Tinha o grande previlégio do " Caso Vespa" como chamavam ao processo na esquadra, ter ficado entregue ao seu superior, mas talvez pelo facto de ser mulher num trabalho de homem, talvez por durante três longos anos se vira constantemente preterida no acesso a uma promoção, só por ser gaja, obviamente, ela não estava disposta a abandonar tudo fácilmente.
Entrara na polícia por um golpe de sorte, pois para sua felicidade o seu pai era ultra conservador e contra a chance de virar dona de casa, ou gerir o restaurante da família, optou por um uniforme.
Tinha sido uma dura batalha, um pesado braço-de-ferro entre ela e o pai, mas havia sido precisamente essa guerra que lhe dera "ganas" para ascender sucessivamente na carreira, até estagnar no mais alto cargo que uma mulher já ocupou na polícia. Bom pelo menos no historial daquela esquadra.
Para complicar um pouco mais as coisas, nunca tivera um grande caso para resolvêr (se ao menos fosse gajo...), nunca tivera uma grande oportunidade para brilhar e para mostrar serviço, sempre seguira na sombra, em tarefas menores.
Não que as tarefas menores a incomodassem, ou a deixassem sentir diminuida, mas ela precisava de mais adrenalina....
Pousou os pés no tampo da mesa, inclinando-se para trás na cadeira giratória, cruzou os braços atrás da cabeça e fechou os olhos.
Gostava especialmente dos fins de tarde, ali fechada no seu pequeno gabinete. Gostava igualmente de pensar, de raciocinar. No fundo, para ela era como uma droga, tornava-se viciante. Tivera um bom professor na polícia, que lhe ensinara o poder da meditação. Ele era especialmente conhecido por ter resolvido 90 por cento dos seus casos até se reformar.
"São os casos aparentemente aqueles onde deves perder mais tempo a meditar. Verás que com o tempo há sempre pormenores que não encaixam" , dissera-lhe ele um dia após três boas doses de Whisky.
Mas apesar do conselho, ser um bom conselho, ela não achava este caso da Vespa nada fácil. O pior é que era só ela na esquadra a pensar assim.
Para piorar mais as coisas, tinha aquele ser balofo irritante, o belga chato, sempre convencido que ele é que é o bom e tal e com a obcessão por tentar relacionar tudo com a droga....Como poderia a droga ter algo a vêr com um acidente?
Acenou negativamente a cabeça e voltou a lêr. Repetiria as vezes que fossem precisas, até que os pelos no pescoço parassem de se eriçar.
Fôra realemnte isso que a despertara para este caso! Podia ser aquilo a que chamam sentido feminino, mas quando algo não lhe agrada numa investigação, a primeira pista que recebe provém do seu pescoço, dos pelos eriçados. Talvez seja um instinto de sobrevivência, pensou.
"Repara, se chegas à mesma conclusão que toda a esquadra e sentes que foi fácil chegar a essa conclusão, então experimenta eliminar o supérfulo. Se mesmo assim nada se alterar, então fecha a merda do caso!"
Ok, eu faço-o, praguejou ela entre dentes de olhos fechados. Dando um soco leve no tampo da mêsa, endireitou-se, pegou numa folha de rascunho e tirando o lápis roído da boca, iniciou a análise:
1-O puto conduz a Vespa,sua propriedade recente, num caminho que habitualmente não usa...Porquê?
2-Numa descida com pouco espaço de manobra, o puto não pára de acelerar...Perseguido ou atrasado?
3-No fundo da descida, o gajo perde o controle da Vespa e despista-se...Travou?
4-Por coincidência, na viatura que segue atrás e que supostamente não evita o embate é Nicolas...Outro fora do caminho habitual,porquê?
5-Como resultado do despiste na mota, ele é abalroado por trás, sendo projectado contra o Mirante e cai ao mar...má sorte?
Decidida, começou a responder em voz alta:
Ponto 1, o puto comprou a vespa à "filha" de Nicolas, pagou a pronto, os pais dele sabiam da compra. Nada a esconder portanto. Sendo dia de semana, devia estar nas aulas e não a circular por aí. Não se sabe se ele tinha algum encontro, o que nos leva ao ponto 2, das duas uma, ou ele tinha algum encontro, ou ia a fugir. Como Nicolas seguia atrás era obvio que ele ia a fugir e já sabemos porquê.
Ponto 3 Parece-me pouco provável que ele tenha tido tempo para reagir. Testemunhas confirmam que bateu num  veículo estacionado antes.Ponto 4 não encontramos qualquer motivo para Nicolas estar por aqueles lados o que reforça a teoria de perseguição.
A porta abriu-se de rompante, onde um agente fardado espreitou a sorrir:
-Que se passa? - Respondeu ela aborrecida pelo incómodo.
-O Belga deu-nos uma pista sobre o paradeiro do suspeito da Vespa. Queres vir?
-Passo! - Responeu sem paciência.
O Belga, sempre o Belga mais a droga dele. Ela a tentar resolver as suas duvidas e sempre ele....
Parou estática por uns segundos, retendo o clarão mental que acabava de têr e sem perder mais tempo, ligou o computador, acedeu aos ficheiros internos da Esquadra, navegou pelos contactos e encontrou o endereço de email que pretendia. Rápidamente, escreveu uma breve missiva e clicou em enviar.
Algo não lhe cheirava bem desde o início e tanto quanto se podia recordar, ninguém assumia o tráfico de estupefaciantes com o caso. Ela própria estivera em casa do puto e nada de suspeito vira. O unico gajo que falava em droga era o Belga....Porquê? Bom, valia a pena aguardar resposta.
Manteve o ar calmo por uns longos minutos até que a resposta surgiu eentão a surpresa apoderou-se dela. Prontamente imprimiu o que recebeu, vestiu o blusão de cabedal, desligou o PC e com a folha na mão, abandonou o gabinete.
Caso fácil uma ova, as surpresas não páram de chegar, gemeu ela entre dentes!


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