domingo, 23 de outubro de 2011

Infidelius - Parte II - Capitulo 3 (6)



"Despes-me os sentidos
desmantelas as minhas defesas
esvazias-me o cinismo
desligas o meu Lirismo

http://rabiscosdealma.blogspot.com/2011/07/escravo-me-confesso.html

O sujeito de pequena estatura e olhar confiante subiu os ultimos degraus do prédio rústico na periferia da cidade, ignorando em parte a antiga dor na rótula esquerda.
No charme de uma cantada a qualquer donzela, o sujeito apressava-se a esclarecer no seu sotaque Belga que era uma ferida antiga de guerra, quando foi apanhado numa emboscada.
Na verdade a ferida era derivada de algo bem menor, como uma queda de bicicleta aos vinte anos e que desde então, nos dias mais frios o joelho inxava-lhe um pouco.
Mas para Jerome Duprix, nada mais tinha importância que cativar as boas graças de uma dama. Se tudo fosse feito com Elan e carisma, não só assegurava o seu naco de insipientes aventuras, bem como com alguma sorte reconfortava o estômago, por entre rasgados elogios, estudados para a ocasião.
Mas a idade já lhe pesava um pouco e o espelho que tantas vezes usara na prisão, avisava-o regularmente que já não era o galã de outrora.
Contudo, conhecedor da mente feminina como era, Jerome sabia no seu íntimo que por mais rugas que tivesse, que por mais desleixado que aparentasse, nada disso tinha relevância diante de uma finura no trato e de um piropo simpático.
Já no ultimo degrau, após olhar de soslaio para a imensidão da escadaria que subira, suspirou e arranjando com dois dedos da mão esquerda o nó da gravata, avançou em direcção ao escritório.
Desde que saíra da prisão, para onde fora atirado pelo seu ex-sócio e antigo pupilo Nicolas, que Jerome preparou todo este seu regresso. Demorou algum tempo a descobrir o paradeiro do seu pupilo e demorou ainda mais tempo a preparar um plano.
Com a idade os pequenos contratempos tornam-se mais difíceis de contornar, se bem que o planeamento seja através da experiência, muito mais consistente.
Descobrira o paradeiro de Nicolas por um feliz acaso e irónicamente se ele nunca tivesse sido preso, peder-lhe-ia o rasto. Numa feliz coincidência do Destino, o inspector que o havia prendido ficara encarregue pelo tribunal de vigiar a sua liberdade provisória. Era uma espécie de vista indesejada que todas as quartas-feiras visitava o pequeno quarto de Jerome e se certificava de que o velhote estava já afastado dos golpes.
Enquanto aguardava plácidamente que o seu fôlego regularizase após a subida da escadaria, ele recordou o momento em que o inspector, batendo-lhe ao de leve no joelho lhe confidenciou:
-Descobrimos o paradeiro do seu amigo.
-Ah sim? - Inquiriu disfarçando a curiosidade.
-Portugal. O gajo pirou-se para Portugal e consta-se que vive folgadamente.
-Ah, que bem...
-Como eu não acredito que ele esteja a trabalhar honestamente, pedi ao comandante que me enviasse lá para estudá-lo e tentar apanhá-lo em flagrante.
-Bem precisa de férias... - Satirizou Jerome.
-Não, não são férias. Eu estou convicto que o nosso pequeno peixe, anda armado em tubarão.
-E o seu chefe concordou?
-Claro que sim. Eu não fui parvo ao ponto de lhe dizer qual o verdadeiro motivo!
-Ah sim? - InquiriuJerome já bastante interessado.
-Claro. Arranjei uma estória mal amanhada sobre correios de droga de Portugal para a Bélgica e pedi autorização. Sabe como a Bélgica é intolerante com isso...
-Oui. Por isso nunca me meti nesses negócios de pó.
-Exacto e foste esperto!
-Não me orgulho desses tempos. - Mentiu Jerome.
-Bom, de qualquer forma, já tenho o bilhete de avião aqui no bolso e parto amanhã. Eles estarão à min ha espera.
-Oui. Hoje em dia é tudo mais fácil. Manda-se uma foto por email e o currículo e eles sabem quem têm de ir esperar.
-Não. Vou undercover, sem ser detectado, aliás creio que eles não fazem a minima ideia se sou magro, baixo ou gordo.
-Ah...
Numa fração de milésimos de segundo um plano atravessou a mente do pequeno sujeito, como uma flecha ultrapassa uma cana-de-açucar e sem pensar, ergueu-se delicadamente, pousou a chávena de chá e aproveitando a faca do pão na cama, espetou-a no inspector tapando a sua boca.
Um arrepio percorreu-lhe o corpo, como sempre acontecia de cada vez que se recordava desse momento.
Havia sido a primeira vez e a unica que matara alguem, o que só provava o ódio que acumulara em relação a Nicolas.
Depois de dois anos prêso, voltava ao seu habitat, mas mais mortífero que nunca e disposto a pagar na mesma moeda e a trata de Nicolas.
Jerome sacudiu a cabeça e entrou no pequeno gabinete, em passos curtos, esperando que a mulher lhe desse atenção:
-Bom dia em que posso ajudá-lo?
-Creio que o responsável não está. Verdade?
-Efectivamente. Encontra-se no estrangeiro. - Assentiu a mulher muito profissionalmente.
-Optimo.
-Perdão?
-Vinha falar consigo.
-Comigo? - Indagou ela desconfiada.
-Oui madame. Permita-me que me apresente, sou o Inspector Claude D´Arrette, da segunda divisão da policia Belga.
-Sim, mas...
-Madame, ia pedir-lhe que me dispensasse uns minutos da sua atenção.
-Certamente, mas em que o posso ajudar? - Retorquiu com os olhos postos no crachá do sujeito.
-Temo que seja um assunto desagradável.
-Ah sim?
-Sobre esta motorizada.
Apressadamente Jerome mostrou a foto da Vespa, com as marcas evidentes do acidente. Marlene demorou alguns segundos até a reconhecer:
-Oh,era a Vespa da minha filha Marisa. Reconheço perfeitamente.
-Oui. Efectivamente era...
-Meu Deus, ela está bem?
-A Vespa? - Inquiriu ele de modo a confundi-la.
-Não, a Marisa...
-Oui, ela está bem.
Minutos depois Marlene estava sentada diante da mesa rectangular a olhar atentamente para o pequeno sujeito:
-Não entendo, se é da Bélgica porque está aqui?
-Uma longa história...
-Mas que diabo aconteceu a essa Vespa?
-Um acidente...Madame, permita-me que comece pelo início.
-Claro, desculpe. Ao ver a mota fiquei nervosa, comece por favor.
-Bom, como lhe disse essa motorizada esteve envolvida num acidente, que resultou na morte do condutor.
-Oh meu Deus...
-Sim, mas era o novo proprietário da motorizada e creio que a madame não o conhecia.
-Não sei a quem foi vendida, isso é um facto.
-Oui, c´est vrai. Mas acontece que eu sei.
-Ah sim?
-A Vespa foi vendida pela sua filha a um colega da sua escola. Aliás, ele era bem mais que um colega, era o namorado de sua filha.
-Tolice, a Marisa não tem namorado.
-Tinha. Isso é um facto.
-Desculpe mas eu conheço a minha filha. Entre nós não há segredos e ela nunca me contou algo assim...
-Segredos? - Inquiriu Jerome maravilhado.
-Sim, segredos. Não temos segredos de qualquer espécie.
Jerome entrelaçou as mãos olhando-a fixamente. Sabia que tinha de ser duro agora com ela, para quebrar todo aquele gêlo e finalmente sacar as informações que pretendia:
-Sabe madame, quando aprendi o Português uma das palavras mais fáceis de aprender a dizer foi precisamente a palavra segredo. Uma palavra muito similar ao que se ouve no Mundo. Em inglês secret, em Espanhol...
-Eu sei como se diz em Espanhol. - Interrompeu Marlene irritada.
-Bom, todos sabemos dizer a palavra, mas na verdade nunca estamos preparados para esconder um segredo. Quem esconde um segredo? Todo o Mundo.
-Pode ser, mas asseguro-lhe...
Jerome tirou da pequena pasta a segunda fotografia dessa tarde. Era uma fotografia antiga de Nicolas:
-Este homem tem um segredo.
Marlene ficou sem palavras ao ver uma foto tão antiga de Nicolas, nas mãos de um sujeito do mesmo País e então o seu alarme interior soou com toda força. Todos os seus músculos reagiram , fortificando o corpo e tomando-lhe a capacidade de falar ou de agir:
-Este senhor que a madame conhece por Nicolas Duprix ou qualquer outro nome que use agora, não é mais que Jean Mercourri, se esse fôr obviamente o seu nome verdadeiro. Jean é um velho conhecido meu, visita assídua da minha prisão...
-Não acredito que...
-Cumpriu duas penas graves e toda a esquadra o conhece...
-Deve haver engano, ele era incapaz de fazer algo errado.
Jerome levantou-se calmamente e sem desviar o olhar de Marlene, inquiriu:
-Defina algo errado?
-Crime. Ele era incapaz de cometer algum crime.
-Ah sim?
-Tenho a certeza absoluta.
-Bom - gritou Jerome batendo com as mãos numa unica salva de palmas- se a madame afir ma, está resolvido. Ele é inocente então.
-Tenho a certeza.
-Muito bem madame, peço desculpa pelo seu tempo.- E apressadamente começou a guardar as fotos.
-Mas espere, não pode chegar aqui a acusar uma pessoa e de seguida ir-se embora.
-Não posso?
-Claro que não. A que propósito é que me veio perguntar sobre Nicolas?
Jerome respirou fundo, como se de uma peça teatral se tratasse e sorrindo timidamente, retorquiu:
-Mas madame eu não fiz qualquer pergunta sobre Nicolas. Não há efectivamente nada que me possa dizer dele que eu não saiba. Eu sei tudo dele e sei tudo sobre a sua filha.
-O que Marisa tem a ver com tudo isto? -Indagou ela desconfiada.
-Tudo. Afinal é com ela que ele está agora, não é verdade?
-Sim. Claro são os anos dela e ele é o pai que...
-Ele é o pai?
-Forma de falar, ele apenas faz esse papel.
-Acredita nisso?
Marlene ficou calada, tomada de pânico, olhando-o com uma expressão aterrada:
-Não me perguntou prque Nicolas foi prêso várias vezes.
-Meu Deus...
-Nicolas ou Jean, como pretender foi preso por pedofilia e violação de menores...- Soletrou Jerome muito devagar para ter a certeza que Marlene o percebia.
-Não, não é possível...
-A madame é mãe. Sente isso melhor que ninguem. Feche os olhos e medite, ouvindo pela primeira vez o seu coração e o seu instinto...
-Não posso acreditar...
Enquanto Jerome ia dispondo sobre a mesa o que pareciam recortes de jornal com fotos de Nicolas algemado e outras notícias em Francês sobre os seus crimes a mente de Marlene processava rápidamente imagens do passado, qual scanner a um disco duro, procurando evidências até então ignoradas pelo seu instinto.
Recordava agora uma vez após o jantar, logo no iníco da sua relação, quando após ele vestir o pijama, se ofereceu para lêr uma história a Marisa  , sentando-a no seu colo na sala-de-estar. Recordava-se perfeitamente do volume nas suas calças quando ele regressou e sem dizer qualquer palavra a tomou violentamente na cama, sem lhe dar tempo de se preparar de se humedecer em baixo, ao passo que ele estava já duríssimo.
Recordava-se igualmente de como Marisa ficava irritada de cada vez que ele beijava Marlene na sua presença, do modo como ele olhava para ela.
O inspector belga dizia-lhe algo, mas ela não conseguia ouvir. Na sua mente os risos de cumplicidade dos dois, o pénis de Nicolas erecto, os lábios de Marisa, definidops por Nicolas um dia como lábios de ouro....Meu deus, pensou aterrada, ela chupava-o. A unica coisa que Marlene se recusava a fazer na cama, a filha fazia-o....
Ao fundo a voz grossa do inspector, na sua cabeça a imagem ficcionada de Marisa a chupá-lo e ela amarrada à cama, sendo forçada a vê-los. Marlene delirava, o coração batia-lhe com força...Mãe, maquilhas-me?...lábios de ouro...Mãe quero dar-te prazer....Nick fode-me à bruta...Mas amor, assim Marisa ouve...ela é criança, não percebe...criança num corpo de mulher, disse ele...calhorda....
Será que ele a fodia? Se a fodesse, imitava as posições que usava com Marlene, ou seria com ela que ele imitava as posições que usava com Marisa? Quem era a mulher....quem era a amante? Jerome dissertava sobre as qualidades de uma mãe vigilante, quando viu desaparecer toda a côr do rosto de marlene, apressando-se a levantar-se:
-Madame, está a sentir-se bem?
Como se acordasse de um êxtasse, Marlene encarou-o e sem forças, proferiu antes de desmaiar:
-Que parva fui!

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